Entenda o impasse criado no setor bancário após a redução da taxa do crédito consignado

Na última semana, a mudança realizada pelo CNPS (Conselho Nacional de Previdência Social) em relação à remuneração da taxa de crédito consignado dos beneficiários do INSS provocou uma reação fortemente negativa no setor bancário, levando várias instituições financeiras, inclusive, a suspender a concessão da modalidade.

     É interessante mencionar, antes de tudo, que, ao contrário das outras modalidades de crédito, o crédito consignado é tabelado pelo Estado brasileiro, através do CNPS, cujas decisões são tomadas de forma colegiada. O órgão é presidido pelo ministro da Previdência Social e é composto por representantes do governo federal, dos aposentados e pensionistas, dos trabalhadores em atividade e dos empregadores. Ao todo, existem 15 integrantes que se dividem da seguinte forma:

  • Seis do governo
  • Três dos sindicatos de empregados
  • Três dos aposentados
  • Três dos sindicatos de empregadores

     Dessa maneira, a deliberação proposta pelo Ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, foi aprovada pelo colegiado sem passar pelo núcleo central do governo e pela Casa Civil. A decisão não teve aval da equipe econômica de Fernando Haddad e aparentemente causou estranhamento até no presidente Lula, que tem se mostrado incomodado com decisões unilaterais tomadas por alguns dos seus ministros.

     De acordo com Lula, era preciso que o governo conduzisse um “acerto” entre as pastas da Previdência, da Fazenda, do Planejamento e os bancos públicos e privados. O petista chegou a criticar a taxa de juro cobrada pelos bancos, mas centrou as críticas no papel de Lupi ao criar mais uma crise interna no governo.

     Além dos problemas políticos causados pela medida, as empresas do setor bancário reagiram naturalmente muito mal à redução anunciada, suspendendo, ao menos momentaneamente, as concessões de crédito consignado, conforme mencionado. A medida foi considerada tão inviável pelo setor que a modalidade de crédito foi suspensa até por instituições financeiras controladas pelo Estado brasileiro, como Caixa Econômica e Banco do Brasil, os quais possuem 11% do mercado do consignado para aposentados.

     A medida anunciada trata-se de uma redução dos juros do crédito consignado para beneficiários do INSS de 2,14% para 1,7%, ao passo que as operações de cartão de crédito consignado tiveram a taxa reduzida de 3,9% para 2,65% ao mês. Essas reduções propostas pelo Ministério da Previdência, na prática, inviabilizam a concessão desse tipo de crédito para a maior parte das instituições brasileiras, sejam elas públicas ou privadas, já que esses patamares de juros fixados não suportam a estrutura de custos do produto, na maior parte dos casos. Vale mencionar que dos 39 bancos que oferecem o crédito consignado compilados pelo Banco Central, apenas quatro instituições ofereciam taxa inferior ao novo teto de 1,70% ao mês.

     De acordo com a Federação Brasileira de Bancos, alterações como a aprovada pelo CNPS “geram distorções relevantes nos preços de produtos financeiros, produzindo efeitos contrários ao que se deseja”. Além disso, a instituição ainda alegou que a iniciativa tende a “restringir a oferta de crédito mais barato, impactando na atividade econômica, especialmente no consumo”. É válido apontar que o setor financeiro já havia se manifestado junto ao Ministério da Previdência e ao INSS, afirmando que, neste momento, considerando os altos custos de captação, eventual redução do teto poderia comprometer ainda mais a oferta de empréstimo consignado.

     “Iniciativas como essas geram distorções relevantes nos preços de produtos financeiros, produzindo efeitos contrários ao que se deseja, na medida em que tende a restringir a oferta de crédito mais barato, impactando na atividade econômica, especialmente no consumo”, afirmou a federação.

     É interessante destacar que as duas linhas de crédito consignado do INSS —empréstimo e cartão— têm saldo de R$231 bilhões emprestados, segundo dados do Banco Central. Ao todo, existem 14,5 milhões de aposentados e pensionistas com um benefício médio de R$1.576,19 que tomaram esse tipo de crédito. Do total de segurados, 42% são pessoas que estão com o “nome sujo”.

     Certamente faltou aos formuladores da medida a compreensão de que qualquer limite nas taxas de juros para bancos nunca é neutro, especialmente porque o funding ou o custo de captação encontra-se num patamar consideravelmente elevado, já que a taxa Selic se encontra em 13,75% ao ano.

     Diante da inviabilidade da medida, representantes do setor financeiro têm expectativa de que, após a reunião dos ministros, outros atores sejam incluídos na discussão e que se busque uma taxa mais baixa, mas que seja economicamente viável. Enquanto durarem as negociações, as instituições defendem a suspensão da resolução aprovada pelo conselho da Previdência, o que viabiliza a retomada da oferta de crédito com base no teto anterior.

     Foi possível entender um pouco sobre o impacto da decisão do CNPS no setor bancário? Deixe as suas dúvidas nos comentários e até a próxima!

Milton Rabelo

Analista CNPI 2444

@miltonrabelo.financas

Artigos Relacionados

Porque assinar a nossa newsletter?

Notícias Notícias

Os nossos analistas realizam uma curadoria cuidadosa das principais notícias sobre a bolsa de valores e nós te enviamos, por e-mail, a visão da VG Research sobre como isso pode impactar os seus investimentos.

Artigos Artigos

Tenha acesso a artigos completos e detalhados, toda a semana, sobre os principais temas relacionados à investimentos, empresas e economia.

Vídeos Vídeos

Aulas online e gratuitas sobre a bolsa de valores para te ajudar a entender mais sobre o universo das ações e saber tomar melhores decisões com os seus investimentos, sempre com foco em crescimento de patrimônio e aumento da renda passiva.