Quem investe em ações precisa olhar além do lucro — e entender o endividamento da empresa logo de início.
Uma companhia pode até apresentar bons resultados, mas, se vive pressionada por dívidas ou depende de empréstimos constantes para operar, isso afeta diretamente a sua estabilidade e o risco para o investidor.
Quando você avalia o endividamento, consegue perceber se a empresa administra bem suas obrigações, se mantém equilíbrio financeiro e se tem capacidade real de crescer sem comprometer o caixa.
Por isso, antes de decidir onde colocar seu dinheiro, vale analisar esse indicador com atenção.
Ele ajuda a identificar negócios mais saudáveis, preparados para atravessar ciclos difíceis e gerar valor no longo prazo.
O que é endividamento?
Endividamento é o quanto uma empresa depende de recursos de terceiros, como bancos, fornecedores ou investidores, por exemplo, para financiar suas operações.
Em termos simples, ele mostra qual parte das atividades é sustentada por dívidas e qual parte vem do próprio capital da empresa.
Na prática, o endividamento revela o quanto a companhia recorre a dinheiro emprestado para investir, expandir ou manter o funcionamento do dia a dia.
Quando bem administrado, ele ajuda a impulsionar o crescimento. Mas, quando passa do limite, aumenta o risco financeiro e compromete a saúde da empresa.
Índice de endividamento
O índice de endividamento mostra qual parte dos recursos de uma empresa vem de capital de terceiros.
Ele compara o total de dívidas com o total de ativos para indicar o nível de risco financeiro e a capacidade de a empresa honrar seus compromissos.
A fórmula mais usada é:
Índice de Endividamento = (Passivo Total / Ativo Total) × 100
Exemplo:
Se uma empresa possui R$ 300 milhões em dívidas e R$ 1 bilhão em ativos, seu índice de endividamento é de 30%.
Isso significa que 30% do que a empresa utiliza para operar vem de dívidas, enquanto 70% é financiado com recursos próprios dos acionistas.
Como calcular o endividamento?
Além do índice geral, existem outras formas de medir o endividamento, cada uma destacando um aspecto diferente da estrutura financeira da empresa. Entre as mais usadas pelos investidores estão:
1. Endividamento geral
- Mostra quanto do ativo é financiado por dívidas.
- Fórmula: Passivo Total / Ativo Total
- Útil para avaliar o risco no longo prazo.
2. Endividamento de curto prazo
- Foca apenas nas obrigações que vencem nos próximos 12 meses.
- Fórmula: Passivo Circulante / Passivo Total
- Indica a pressão de liquidez no curto prazo.
3. Endividamento financeiro líquido
- Considera apenas dívidas que geram custo financeiro, descontando o caixa disponível.
- Fórmula: (Dívida Bruta – Caixa e Equivalentes) / Patrimônio Líquido
- É o indicador mais acompanhado pelos analistas, pois revela a exposição financeira real da empresa.
Empresas bem estruturadas mantêm o endividamento líquido sob controle, evitando que os juros comprometam a geração de lucro.
Tipos de endividamento
O endividamento pode ser dividido em duas categorias principais:
1. De curto prazo
São dívidas com vencimento inferior a 12 meses, como fornecedores, capital de giro, linhas de crédito rotativo e empréstimos bancários, por exemplo.
Elas exigem controle rigoroso de caixa, já que pressionam a liquidez imediata.
2. De longo prazo
Inclui obrigações que vencem após um ano, como debêntures, financiamentos e contratos de leasing, por exemplo.
Geralmente está associado a expansão, investimentos e projetos estruturais.
Setores que demandam grandes volumes de capital, como energia, infraestrutura e aviação, por exemplo, costumam ter níveis maiores de endividamento.
Isso não é, por si só, um problema: o ponto crítico é a capacidade de gerar caixa suficiente para pagar juros e amortizações ao longo do tempo.
Endividamento geral e grau de endividamento
O endividamento geral é a métrica mais ampla de alavancagem, porque considera todas as dívidas da empresa — tanto de curto quanto de longo prazo.
Ele mostra, de forma consolidada, o quanto a companhia depende de capital de terceiros para operar e crescer.
Já o grau de endividamento compara o capital de terceiros com o patrimônio líquido, revelando como a empresa estrutura suas fontes de financiamento.
Fórmula:
Grau de Endividamento = Capital de Terceiros / Patrimônio Líquido
Se o indicador for 1,0, significa que a empresa tem R$ 1 em dívidas para cada R$ 1 de capital próprio.
Valores acima de 2 sugerem risco financeiro elevado, enquanto resultados abaixo de 1 indicam menor alavancagem e uma estrutura de capital mais conservadora.
Análise de endividamento
Analisar o endividamento não é só olhar números: é entender se a empresa realmente consegue pagar o que deve usando o próprio caixa operacional.
Um dos indicadores mais usados para isso é o Dívida Líquida / EBITDA, que mostra quantos anos de geração de caixa seriam necessários para quitar as dívidas financeiras.
Cada setor tem um limite considerado saudável:
| Setor | Dívida Líquida / EBITDA considerada saudável |
| Varejo | até 2,0x |
| Energia | até 3,0x |
| Construção civil | até 4,0x |
| Bancos | depende do modelo de negócio |
Mais importante que o tamanho da dívida é a capacidade de pagá-la com consistência.
Por isso, analistas também avaliam:
- evolução da dívida líquida ao longo do tempo;
- custo médio da dívida (taxas de juros);
- cronograma de vencimentos;
- nível de caixa e liquidez disponível.
Endividamento saudável
Nem toda dívida representa um problema. Um endividamento saudável é aquele que ajuda a empresa a crescer sem colocar a solvência em risco.
Isso ocorre quando a companhia usa capital de terceiros para financiar projetos rentáveis, mantendo controle sobre juros, prazos e capacidade de pagamento.
Na prática:
- se a empresa financia R$ 100 milhões a 10% ao ano e o projeto entrega 15% de retorno, o endividamento cria valor;
- se o custo da dívida é 13% e o retorno fica em 10%, o resultado é destrutivo.
A lógica também vale para a vida pessoal:
- usar crédito para formação, negócios ou ativos produtivos tende a ser positivo;
- recorrer a dívidas para consumo ou giro de juros leva à deterioração financeira.
O bom endividamento impulsiona o crescimento. O mau endividamento limita o futuro.
O que investidores devem observar?
Para quem analisa empresas listadas na Bolsa, o endividamento não deve ser avaliado isoladamente. Ele ganha sentido quando combinado a outros indicadores que mostram a real capacidade de pagamento e criação de valor, como, por exemplo:
- Rentabilidade (ROE, ROIC): indica se o retorno supera o custo da dívida.
- Liquidez corrente: revela se a empresa consegue pagar compromissos de curto prazo.
- Margem EBITDA: mostra quanto sobra para cobrir juros e manter operações.
- Fluxo de caixa operacional: evidencia a geração efetiva de caixa — o fator mais importante na análise de solvência.
Conclusão
Por fim, o endividamento pode ser um aliado importante no crescimento das empresas, desde que usado de forma disciplinada.
Quando a dívida financia projetos rentáveis, ela impulsiona resultados, mas quando foge do controle, corrói margem, reduz competitividade e destrói valor.
Para investidores, compreender o endividamento ajuda a medir com precisão o risco financeiro de cada empresa.
Assim, identificar companhias que crescem com responsabilidade, mantêm estrutura de capital equilibrada e têm caixa suficiente para honrar compromissos.
São esses negócios que tendem a prosperar no longo prazo — e a recompensar melhor seus acionistas.