Em uma carta escrita aos acionistas da Berkshire Hathaway em 1984, Warren Buffett afirmou que:
“Por inúmeras razões, gestores gostam de reter lucros irrestritos que seriam prontamente distribuíveis para os acionistas – seja para expandir o império corporativo sobre o qual os gerentes governam, operar a partir de uma posição excepcional de conforto financeiro, entre outras razões. Mas nós acreditamos em apenas uma razão válida para reter [lucros]. Lucros irrestritos devem ser retidos apenas quando há uma perspectiva razoável – de preferência fundamentada por evidências históricas, ou, quando apropriado, por uma análise profunda do futuro – de que para cada dólar retido pela corporação, ao menos um dólar de valor de mercado será criado para seus proprietários [acionistas]. Isto só irá acontecer se o capital retido produz um lucro incremental igual, ou acima, aos geralmente disponíveis para os investidores” [tradução minha]. O texto original está disponível em https://www.berkshirehathaway.com/letters/1984.html.
Observação: O lucro restrito é entendido por Buffett como o lucro destinado à manutenção do ativo corrente, essencial ao core business, como CAPEX (i.e., despesas de capital, como um novo veículo que substituirá um veículo antigo, já depreciado). Lucro irrestrito, por outro lado, representa o lucro restante.
Para cada dólar retido, uma empresa deve criar pelo menos um dólar em valor de mercado. Em outras palavras, se uma determinada companhia decide reter R$1,00, devemos verificar um aumento de pelo menos R$1 no seu valor de mercado ao longo do tempo. O racional deste teste é de que fundamentos devem se traduzir, ao longo do tempo, em retorno no mercado. Se isto não for possível, retornar o capital aos acionistas pode ser uma decisão mais inteligente. Buffett faz este teste com base em uma janela móvel de 5 anos.
O teste depende de dois inputs relativamente simples: lucros retidos, isto é, o lucro que sobra após o pagamento dos dividendos, e a capitalização de mercado. O lucro retido é facilmente calculado como a subtração entre o lucro do período e quanto foi pago em dividendos naquele mesmo período. O teste pode ser dado pela divisão entre o valor de mercado criado em 5 anos e o lucro retido (de uma janela móvel de 5 anos). Abaixo, apresento um cálculo também considerando uma janela de 10 anos. É válido testar a sensibilidade para diferentes janelas.
Exemplificando
A seguir, apresento um exemplo do Teste de US$1 de Buffett com base na Netflix (NASDAQ: NFLX). A Netflix não paga dividendos e, por essa razão, o seu lucro retido é igual ao seu lucro líquido. Os dados de lucro e pagamento de dividendos foram coletados nos Formulários 10-K (equivalente às Demonstrações Financeiras Padronizadas), enquanto os dados de capitalização de mercado foram coletados na Thomson Reuters Eikon.
Podemos concluir que, para o período de 10 anos, cada US$1 retido gerou um valor de mercado de US$21,20. Para uma janela de 5 anos, para cada US$1 retido foi criado US$18,62 em valor de mercado. Porém, parece existir uma certa tendência quando analisamos os dados ano a ano: apesar da Netflix aparentemente passar no teste em todos os anos, gerando mais de US$1 em valor de mercado para cada US$1 retido, cada US$1 retido tem gerado cada vez menos valor de mercado.
Se cada US$1 retido gerasse menos de US$1 em valor de mercado poderíamos preliminarmente assumir que, talvez, a alocação de capital da empresa não seja tão eficiente assim. Porém, trata-se de apenas um framework, e deve ser analisado sempre em conjunto com outras ferramentas/técnicas de análise da qualidade de alocação de capital.
Teoria
Não é novidade que no mundo das Finanças valor é gerado quando o retorno de um investimento supera o seu custo de capital. A intuição por trás do Teste de US$1 de Buffett é que se uma determinada companhia não é capaz de gerar valor de mercado com base em US$1 retido, talvez seja melhor destinar este US$1 para o bolso dos acionistas, que podem fazer outro uso – aqui reside implicitamente o conceito de custo de oportunidade. Entre US$1 no seu bolso hoje e US$1 alocado de forma que tem destruído valor, o que você preferiria?
Em uma gestão que procura maximizar os interesses dos acionistas, destinar este dólar ao bolso dos acionistas talvez seja a melhor decisão. O gráfico a seguir ilustra os questionamentos que um gestor deve se fazer em relação ao lucro excedente:
É interessante notar que Buffett assume implicitamente a existência de um mercado ao menos semi-eficiente em seu teste. O mercado precificaria positivamente a empresa que gera valor e negativamente a que destrói valor ao longo do tempo – o que fundamenta a existência da análise fundamentalista.
Limitações
É necessário saber que um bom histórico de alocação de capital não necessariamente persiste. Empresas que em um momento souberam alocar capital de forma extremamente eficiente podem se tornar ineficientes. Além disso, ao utilizarmos o valor de mercado, que embora tenha a tendência de ser eficiente em períodos mais elevados, com o valor de mercado tendendo ao valor intrínseco (convergência de mercado e fundamento), este pode se comportar de forma ineficiente mesmo em períodos mais longos.
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